Diário de Bordo do Grupo Arte Simples de Teatro. Sobre a pesquisa e linguagem do grupo, relatos e informações sobre a Residência Artística que realiza na comunidade de Heliópolis desde Março de 2009.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

PRONUNCIAMENTO DO GRUPO SOBRE CONFLITOS EM HELIÓPOLIS

Nós estamos profundamente entristecidos, comovidos e mobilizados pelos últimos acontecimentos em Heliópolis. Extremamente preocupados com nossos queridos moradores, com os quais criamos enorme vínculo afetivo.

Não estamos aqui para darmos nossa opinião sobre a polícia, sobre a mídia, sobre a violência, sobre as diferenças sociais que deixam enormes buracos em nossa sociedade. Somente o que podemos dizer é que somos totalmente contra a violência de qualquer espécie.

Podemos sim opinar sobre nossa vivência e convivência com Heliópolis.
Um bairro tranquilo, com pessoas trabalhadoras e honestas, que lutam pela paz na comunidade e por uma vida digna em meio a tantos percalços. Não é a toa que a última caminhada pela paz tomou todas as ruas do local. Inúmeros trabalhos são feitos para que as crianças de Heliópolis tenham educação e condições de futuro. Trabalhos DA comunidade PARA a comunidade.
É isso que testemunhamos e vivenciamos. A nossa visão, que pode não ser a mais abrangente, pois temos a sorte de conviver com tais pessoas trabalhadoras e honestas, é a visão de quem enxerga na comunidade uma enorme vontade de viver no caminho da paz e seguir em frente perante uma vida difícil.

Como disse Raquel Rolnik, em matéria para um jornal de São Paulo, é preciso desvincular a pobreza da criminalidade. A maioria das pessoas que moram em favelas não estão ligadas ao crime.

Também estamos aqui para relatarmos como os fatos ocorridos repercutem em nossas queridas crianças.
Fomos ministrar as oficinas um dia após a morte da adolescente Ana Cristina de Macedo, 17, atingida por uma bala perdida. O clima estava tenso, as atividades dos Centros para Crianças e adolescentes modificadas, com polícias e redes de TV tomando conta das ruas.
Nessa atmosfera tensa, sentimos as crianças tensas também. Foi difícil cumprir o cronograma de aulas e difícil conseguir a concentração dos alunos. Estavam tensos, desconcentrados, tristes, irritados, bagunçados.

Durante a aula, numa história criada por eles, (onde o imaginário poderia ir para o belo mundo da fantasia), pipocavam armas e tiros, citações à Fundação Casa, ao conselho Tutelar, à violência, morte. A realidade chocante é tão cotidiana que a imaginação vai diretamente para a crueza da violência. Crianças que deveriam sonhar com fadas e castelos, constroem histórias pautadas nessa realidade em que vivem. É de cortar o coração.

Entre inúmeros motivos, a razão dessa parceria com Heliópolis. Criar através da arte possibilidades de formação de seres humanos dispostos a modificar a realidade em que vivem.
Educar para transformar, educar para dar ferramentas para a construção de uma sociedade mais justa, digna e humana.


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